
Era o ultimo domingo de Setembro, um dia claro, mas prometia chuva. É frequente nesta altura do ano o esplendor do Verão concentrar-se solenemente uma última vez, as cores do outono comecem a refulgir. As noites arrefecem, o que torna as madrugadas orvalhosas e as manhãs amenas e agradáveis. A folhagem das árvores escureceu, destacando-se contra o céu como cinzelada. Também nas cidades fica mais frio, invade-as uma aragem de luxo e de euforia.
Dentro de casa no Bombarral estava mais fresco, as ruas tinham acabado de ser lavadas pela chuva. A água escorria ainda pelas bermas dos passeios. A vila parecia mais vazia e, por isso mais solene; grande parte das pessoas estavam dentro de casa, ou no café dos arredores. Este passeio na chuva despertavam em mim uma grande ternura. Estava triste, mas afinada como uma corda de um instrumento em repouso que quase não precisa de uma mão - uma brisa, um raio de sol bastariam para fazer-me vibrar. As coisas intactas envolviam-me como um clarão, visível mesmo aos olhos mais embotados .
Fora agradável caminhar pelo lado sombreado do Sobral, um cavalheiro de idade, que avançava lentamente, passou por mim e aflorou-me com o olhar. Ia a prosseguir o seu caminho, mas como se lhe ocorresse uma lembraça, deu meia volta e, levando cortesmente a mão ao chapéu, disse - Então a senhora, anda à chuva, o que a traz a esta hora por aqui, no Sobral.
Embora receie que a minha companhia lhe vá ser maçadora. Por amor de Deus , não se preocupe com isso - tranquilizei-o, ao mesmo tempo que acenava com a mão, e subia em direcção a casa.
Assim se explica que eu na minha simplicidade não tenha sido prejudicada pelos estragos do meu estilo de vida O caminho percorrido com este espírito mostra-me mais uma vez que não se pode perseverar no refinamento.
Coisas de Domingo.