
Sentada junto à janela, ela olhava para a chuva e recordava. Levou o chá para a cozinha e deteve-se por um momento, a olhar para o sítio exacto onde tinham estado últimamente os dois.
Os sentimentos dentro dela eram avassaladores, como sempre haviam sido. Tão fortes que, com o passar dos dias, só se tinha atrevido a recordá-los detalhadamente uma vez por outra ou a mente ter-se-ia desintegrado com a força emocional.
Tinha que sobreviver, e abster-se de recordar o passado. O novo sentimento, era como se tivesse tomado posse dela em todas as suas dimensões.
Agora ao pensar nos últimos anos, quaze lhe parecia uma coisa normal - espíritual. Espíritual, mas não normal. Ele, é tão poderoso que ela tinha medo, ele era fisicamente poderoso, mas usava a sua força com cuidado.
No entanto, era algo mais do que isso. Mas ele simplesmente apropriara-se dos sentimentos dela.
Ela devia ter percebido no momento em que o vira ir ao encontro dela para lhe dar o seu apoio, e perguntar o que se passava com ela. Nessa altura já lhe tinha parecido um xamã, e essa sua primeira impressão estava certo.
Já não tentava impedir que ele voltasse ou manda-se mensagens, as imagens eram claras e reais e estavam ali. Depois de tanto tempo, mas, lentamente, voltavam a ser a sua realidade, a única em que lhe interessava viver.
Sabia que estava cheia de problemas, e que andava na faixa étaria dos cinquenta. Não podia pensar nisso, não podia concebê-lo nem sequer conceber que pudesse concebê-lo. Ele estava com ela na sua frente,com a camisa branca, e os seus lindos cabelos cinzentos, os sapatos castanhos, a pulseira e a corrente de prata em volta do pescoço. Estava ali acariciando os seus cabelos.
Finalmente, ela afastou-se e agarrou-lhe a mão e entraram na casa de chá para lancharem.
E ela começava a perder a consciência, a respirar com mais força, e deixá-lo levá-la onde ele quizesse e a lugares estranhos.
Com a cara enterrada no pescoço dele e a pele tocando a dele, ela cheirava o mar e o fumo a lenha, ouvia o apitos dos comboios, saindo das estações. E ela murmurava suavemente, sem fôlego: Oh... estou a perder-me.
Ela não fazia ideia do que ele queria dizer, sabia apenas que, de certo modo, ele os tinha atado aos dois e tinha apertado tanto a corda em volta de ambos que ela teria sufocado se não tivesse sido a libertação de si mesma. Ao entardecer, ergueu-se ligeiramente e disse, olhando-a nos olhos.
É, por isso que estou neste planeta, neste momento. Não é para viajar nem tirar fotografias, mas para te amar.
Agora sei-o, tenho estado a cair da beira de um lugar muito grande, muito alto, algures no passado, durante mais anos do que os que vivi nesta vida. Durante todos esses anos, estive a cair para ti.
Sim ? Olhou para ele. Oh, meu Deus, estou amar de novo, pensou, sentindo-se trémula, desejando-o ainda mais, sem descanso. Que vamos fazer? perguntou ele.
Ela ficou em silêncio, um silêncio profundo. Depois disse suavemente. Não sei.
Ela só sabia, tinha o direito de ser feliz
Ele continuava...se não gostas de viajar, abrirei uma loja em qualquer sítio e farei tudo ou o que for preciso para nos sustentar, tu és o meu caminho, onde a ilusão se encontra com a realidade, é ai que tu estás, ai no caminho, e tu és o caminho.
Mas, no fundo, sou apenas um homem. E todas as especulações filosóficas que eu possa configurar não me impedem de te desejar todos os dias, desde que te conheci, todos os minutos, nem o impiedoso grito do tempo, do tempo que nunca pude passar contigo, dentro da minha cabeça.
Amo-te, profunda e plenamente. E amar-te-ei para sempre.