
Ontem à noite como é habitual fui dar um beijo ao meu filho Fábio. Em desabafos, fui aumentando os meus episódios de criança, onde ele prestava muita atenção. Narrando acrescentei...
No colégio, a indiferença que sentiam pelo nosso desenvolvimento interior igualava a extrema rigidez com que tratavam os aspectos mais banais da educação. Tinha de me sentar direita à mesa, com os cotovelos colados ao corpo. Se, ao fazê-lo, só pensava na melhor forma de me matar, isso não tinha qualquer importância. A aparência era tudo, para além dela só existiam coisas inconvenientes.
Assim , cresci com a sensação de era algo semelhante a uma macaca que devia ser domesticada e não um ser humano, uma pessoa, com as suas alegrias, os seus desânimos, a sua necessidade de ser amada. Esse mal-estar depressa gerou dentro de mim uma grande solidão, uma solidão que com o passar dos anos se foi tornando enorme, uma espécie de vácuo onde eu me movia com os gestos lentos e desageitados de um mergulhador. A solidão também nascia das perguntas, das que fazia a mim mesma e às quais não sabia responder: Já aos quatro, cinco anos olhava à minha volta e pensava: Porque estou eu aqui? Donde é que vim, de onde vêm todas as coisas que vejo à minha volta, o que há atrás delas, terão estado sempre aqui, mesmo quando eu não estava, estarão sempre?
Fazia a mim própria todas as perguntas que fazem as crianças sensíveis quando começam a tomar consciência da complexidade do mundo. Estava convencida de que os adultos também as faziam, que eram capazes de responder, mas após duas ou três tentativas com as Freiras, percebi não só que não sabiam responder, mas também que nunca as tinham feito a si mesmas.
Assim foi aumentando a sensação de solidão, compreendes, para resolver todos os inigmas só podia contar com as minhas forças, quanto mais o tempo ia passando, mais perguntas fazia acerca de tudo, eram perguntas cada vez maiores, cada vez mais terríveis, ficava aterrorizada só de pensar nelas.
Indelicadeza? Superficialidade? Sadismo? O que havia naquelas respostas? E porquê? perguntava eu. Porque estavam fartas das minhas maldades. No mesmo instante em que ouvia aquelas palavras, houve algo dentro de mim que se rompeu. Comecei a não dormir de noite, de dia, bastava um pequeno nada para desatar a soluçar. Passado uns poucos anos , chamaram o psiquiatra. A miúda está com um esgotamento, disse ele, e receitou-me óleo de fígado de bacalhau.
E ningém me perguntou porque não dormia, porque andava sempre de um lado para o outro, como uma bola roída.A partir desse momento, as minhas acções deixaram de ser neutras, independentes. Com o terror de cometer mais um erro, fui-as reduzindo ao mínimo, tornei-me apática, hesitante. À noite, apertava o lençol nas mãos e chorava, dizendo: Mãe, por favor, volta e leva-me, gosto mais de ti do que de todos. É por isso que digo que aos seis anos já era grande, porque,no lugar da alegria havia a ansiedade, no lugar da curiosidade, a indiferença. As Freiras seriam uns monstros? Claro que não, eram pessoas absolutamente normais para a época.
Olhei para o meu filho. Dos seus lindos olhos bailavam algumas lágrimas, disse-me docemente. Amo-te muito mãe.
No colégio, a indiferença que sentiam pelo nosso desenvolvimento interior igualava a extrema rigidez com que tratavam os aspectos mais banais da educação. Tinha de me sentar direita à mesa, com os cotovelos colados ao corpo. Se, ao fazê-lo, só pensava na melhor forma de me matar, isso não tinha qualquer importância. A aparência era tudo, para além dela só existiam coisas inconvenientes.
Assim , cresci com a sensação de era algo semelhante a uma macaca que devia ser domesticada e não um ser humano, uma pessoa, com as suas alegrias, os seus desânimos, a sua necessidade de ser amada. Esse mal-estar depressa gerou dentro de mim uma grande solidão, uma solidão que com o passar dos anos se foi tornando enorme, uma espécie de vácuo onde eu me movia com os gestos lentos e desageitados de um mergulhador. A solidão também nascia das perguntas, das que fazia a mim mesma e às quais não sabia responder: Já aos quatro, cinco anos olhava à minha volta e pensava: Porque estou eu aqui? Donde é que vim, de onde vêm todas as coisas que vejo à minha volta, o que há atrás delas, terão estado sempre aqui, mesmo quando eu não estava, estarão sempre?
Fazia a mim própria todas as perguntas que fazem as crianças sensíveis quando começam a tomar consciência da complexidade do mundo. Estava convencida de que os adultos também as faziam, que eram capazes de responder, mas após duas ou três tentativas com as Freiras, percebi não só que não sabiam responder, mas também que nunca as tinham feito a si mesmas.
Assim foi aumentando a sensação de solidão, compreendes, para resolver todos os inigmas só podia contar com as minhas forças, quanto mais o tempo ia passando, mais perguntas fazia acerca de tudo, eram perguntas cada vez maiores, cada vez mais terríveis, ficava aterrorizada só de pensar nelas.
Indelicadeza? Superficialidade? Sadismo? O que havia naquelas respostas? E porquê? perguntava eu. Porque estavam fartas das minhas maldades. No mesmo instante em que ouvia aquelas palavras, houve algo dentro de mim que se rompeu. Comecei a não dormir de noite, de dia, bastava um pequeno nada para desatar a soluçar. Passado uns poucos anos , chamaram o psiquiatra. A miúda está com um esgotamento, disse ele, e receitou-me óleo de fígado de bacalhau.
E ningém me perguntou porque não dormia, porque andava sempre de um lado para o outro, como uma bola roída.A partir desse momento, as minhas acções deixaram de ser neutras, independentes. Com o terror de cometer mais um erro, fui-as reduzindo ao mínimo, tornei-me apática, hesitante. À noite, apertava o lençol nas mãos e chorava, dizendo: Mãe, por favor, volta e leva-me, gosto mais de ti do que de todos. É por isso que digo que aos seis anos já era grande, porque,no lugar da alegria havia a ansiedade, no lugar da curiosidade, a indiferença. As Freiras seriam uns monstros? Claro que não, eram pessoas absolutamente normais para a época.
Olhei para o meu filho. Dos seus lindos olhos bailavam algumas lágrimas, disse-me docemente. Amo-te muito mãe.

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