quarta-feira, novembro 23, 2005

PERDÃO

Escrever é uma das actividades mais solitárias do mundo.Quaze todos os dias, vou para a frente do computador, olho para o mar desconhecido da minha alma, e vejo que ali existem duas ilhas - ideias que se desenvolveram e estão prontas para serem exploradas. Então, agarro no meu barco - chamado Palavra - e resolvo navegar para aquela que está mais próxima. No caminho, defronto-me com correntes, ventos, tempestades, mas continuo a remar, exausta, agora já consciente de que fui afastada da minha rota: a ilha a que pretendia chegar deixou de estar no meu horizonte.
Mesmo assim, não posso voltar atrás; tenho de continuar de qualquer maneira ou ficarei perdida no meio do oceano.
Para minha constante surpresa, outras pessoas estavam em busca daquela ilha, e encontro-as nos meus textos. Uma conta a outra, a cadeia misteriosa aumenta, e aquilo que eu julgava ser um trabalho solitário transforma-se numa ponte, num barco, num meio em que as almas circulam e comunicam.
A partir daí, deixo de ser a mulher perdida na tempestade: encontro-me comigo mesma atravéz dos meus leitores, entendo o que escrevi quando vejo que outros também o entendem - nunca antes disso. Em raros momentos, como neste que está prestes a acontecer daqui a pouco, consigo olhar algumas destas pessoas nos olhos, compreender que também a minha alma não está só.
A energia do sofrimento não irá levar-me a lugar algum; mas a energia do perdão, que se manifesta atravéz do amor, conseguirá transformar positivamente a minha vida.
Agora estou a parecer uma mestra tibetana a dizer coisas que são muito bonitas na teoria, mas impossíveis na prática.. Não me esqueço de que fui ferida milhares de vezes.
Por causa disso, ainda trago dentro de mim a criança que chorou às escondidas do mundo, que era a mais fraca do colégio - Acho que o meu comportamento é humano.
Realmente é humano. Mas não é inteligente nem razoável. Meu coração diz-me...Respeita o teu tempo nesta terra, fica a saber que Deus sempre te perdoou, e perdoa tu também.

quinta-feira, novembro 17, 2005

ÁRVORE

Hoje, quaze me senti uma árvore, porém, eu sei que sou diferente. Desde que desaponta até que morre, está sempre parada no mesmo sítio. As raízes fazem-na estar mais perto do coração da terra do que qualquer outra coisa, a copa fá-la estar mais perto do céu. A linfa corre no seu interior de cima para baixo, de baixo para cima. Expande-se e retrai-se em função da luz do dia. Espera pela chuva, espera pelo sol, espera por uma estação e depois por outra, espera pela morte. Nenhuma das coisas que lhe permitem viver depende da sua vontade. Existe e mais nada. Compreendo agora porque é belo acariciá-la? Pela sua solidez, pela sua respiração tão longa, tão tranquila, tão profunda. Tinha 6 anos, passei uma noite a dormir , num tronco de oliveira. Algures na Bíblia está escrito que Deus tem narinas largas. Embora seja um tanto irreverente, sempre que tentei imaginar uma parecença para o Ser Divino veio-me à ideia a forma de um carvalho.
Na casa da minha infância havia na quinta um, tão grande que eram precisas duas pessoas para lhe abraçar o tronco. Aos quatro ou cinco anos, já gostava muito de ir ter com ele. E lá ficava, sentia a humidade da erva debaixo do traseiro, o vento fresco nos cabelos e na cara. Respirava e sabia que havia uma ordem superior das coisas e que eu estava incluída nessa ordem, juntamente com tudo aquilo que via. Embora não soubesse música, algo cantava dentro de mim.
Não saberia dizer que género de melodia era, não havia um refrão preciso, uma ária. Era mais como se um fole soprasse com um ritmo regular e poderoso na zona próxima do meu coração e esse assobio, espalhando-se pelo interior do meu corpo de criança e na minha mente, produzisse uma grande luz, uma luz que tinha uma dupla natureza: a sua, de luz, e a de música. Sentia-me feliz por existir e, para além dessa felicidade, para mim não existia mais nada.
Pode parecer estranho ou excessivo que uma criança pressinta algo deste género. Infelizmente estamos habituados a considerar a infância como um período de cegueira, de carência, e não como um período em que há muita riqueza. No entanto, bastaria olhar com atenção para os olhos de um recém - nascido para se perceber de que é assim . Alguma vez o fizeram? Quando tiverem oportunidade, experimentem. Pôem de parte os preconceitos e podem observar. Como é o seu olhar? Vazio, inconsciente? Ou antigo, remotíssimo, sábio? As crianças têm naturalmente um fôlego maior, nós, adultos, é que o perdemos e não sabemos aceitá-lo. Aos quatro , cinco anos, eu ainda não sabia nada de religião, de Deus, de todas estas confusões que os homens fazem ao falarem das coisas. Talvez nunca tenha dito, mas fiz os primeiros cinco anos de escola com as freiras, no colégio 28 de Maio , Porto Bradão. Acredito que não foi um prejuízo pequeno para a minha mente já tão instável. Entre os seis e os sete anos, vivi condicionada pelos passos que a bruxa da freira dava. E é inútil dizer que quaze nunca saiu da beira do precipício. Apesar disso, estava sempre prestes a cair. Porquê? Por coisas de nada. Assim começa o Outono com as árvores.

terça-feira, novembro 15, 2005

NOITE

Esta noite o tempo mudou, veio a descida de temperatura, eu à janela da varanda olhava o infínito.Começou o vento do Oeste, em poucos minutos varreu todas as nuvens do céu. Antes de começar a escrever, dei um passeio pela casa. O Dingo estava eufórico, queria brincar, saltitava a meu lado com uma bola na boca. Com as minhas poucas forças só consegui lançá-la uma vez, fez um voo muito breve, mas ele ficou contente na mesma, Depois de ter verificado que eram 3h da manhã, fui cumprimentar as fotos antigas, algumas minhas preferidas.
Enquanto olhava as fotos meu olhar parava por momentos. Sempre os mesmos pensamentos?
O amor não se entrega aos preguiçosos, para existir na sua plenitude exige por vezes gestos precisos e fortes. E comecei a compreender?Eu ocultei minha covardia e a minha indolência sob o nobre disfarce da liberdade.
A ideia do destino é algo que surge com a idade. quando se tem vinte anos, geralmente não se pensa nisso, tudo o que acontece é como se fosse fruto da nossa vontade. Sentimo-nos como um operário que, pedra sobre pedra, vai construindo à sua frente o caminho que deverá percorrer. Só muito depois é que repara que o caminho já está construído, que alguém o traçou para nós, e que só nos resta seguir em frente. É uma descoberta que costuma fazer-se por volta dos 50 anos, então começa-se a perceber que as coisas não dependem só de nós. É um momento perigoso, durante o qual não é raro escorregar-se para um fatalismo claustrofóbico. Para se ver o destino em toda a realidade, tenho que deixar passar mais alguns anos. Por volta dos sessenta, quando o caminho atrás de mim é mais comprido do que o que tenho à minha frente, vou ver uma coisa que nunca tenha visto antes: o caminho que percorri não era direito , mas cheio de encruzilhadas, a cada passo havia uma seta que apontava para uma direcção diferente; dali partia para um atalho, de acolá um carreiro cheio de ervas que se perdia nos bosques. Alguns desses desvios tive que os percorrer sem me aperceber, outros nem sequer os vi; não sei se os que não fiz me levariam a um lugar melhor ou pior; não sei, mas sinto pena. Podia fazer uma coisa e não a fiz, voltar para trás em vez de seguir em frente. O jogo da glória, lembra-me? A vida vai avançando mais ou menos da mesma forma.
Ao longo das encruzilhadas do meu caminho encontro outras vidas, conhecê-las ou não, vivê-las a fundo ou desperdiçá-las depende da escolha que faço num segundo; embora o saiba, entre seguir a direito ou fazer um desvio joga-se muitas vezes a nossa existência, a existência de quem está perto de nós.

Até as macacas, quando são criadas num laboratório asséptico e não pela própria mãe, passado um tempo entristecem e deixam-se morrer.

sábado, novembro 12, 2005

FLUTUAR

Porque será que as verdades elementares são as mais difíceis de compreender? Se eu tivesse compreendido que a principal qualidade do amor é a força, talvez tudo se tivesse desenrolado de forma diferente. Mas, para sermos fortes, é preciso gostarmos de nós; para gostarmos de nós, é preciso conhecermo-nos profundamente, saber tudo de nós, mesmo as coisas mais ocultas, mais difíceis de aceitar. Como é possível levar a bom termo um processo deste género, quando a vida com o seu rumor nos vai empurrando para a frente? Só o pode fazer desde o início quem possui dotes extraordinários.
Para o comum dos mortais, para as pessoas como eu, como a Margarida, só resta o destino dos ramos e das garrafas de plástico. De repente, alguém - ou o vento - atira-nos ao leito de um rio, graças à matéria de que fomos feitos, em vez de irmos ao fundo, flutuamos; isso já nos parece uma vitória e, por isso, de repente, começamos a correr; deslizamos velozes para onde a corrente nos arrasta; de vez em quando, um molho de raízes ou uma pedra obrigam-nos a parar; ficamos para ali durante algum tempo, batidas pela água, e depois a água sobe e liberta-nos, e continuamos em frente; quando o curso é tranquilo, vamos à superfície, quando surgem os rápidos, submergimos; não sabemos para onde vamos e nunca ninguém pergunta; nos troços mais calmos, conseguimos ver a paisagem, os diques, os silvados; mais do que os pormenores, vemos as formas, o tipo de cor, vamos demasiado depressa para vermos outras coisas; depois, com o passar do tempo e dos quilómetros, os diques vão ficando mais baixos, o rio vai alargando, ainda há margens, mas por pouco tempo. Para onde vais - perguntamos então a nós proprias e, nesse instante, à nossa frente, abre-se o mar.
Uma grande parte da minha vida foi assim. Mais do que reparar nas coisas, andei às cegas. Com gestos inseguros e confusos, sem elegância nem alegria, consegui apenas flutuar.
Porque escrevo tudo isto? O que signifícarão estas confissões tão longas e tão íntimas? Talvez já esteja farta, talvez tenha folheado uma página após outra, soprando de impaciência. Onde quererei eu chegar, perguntando, para onde isto me leva? É verdade, enquanto escrevo vou divagando, em vez de me meter pela estrada principal, muitas vezes e de propósito enfio-me por carreiros humildes. Dou a impressão que me perdi e talvez não seja uma impressão: perdi-me mesmo. Mas é este o caminho exigido por aquilo que eu tanto procuro : o centro.
Lembra-me de quando no colégio me ensinavam a fazer crepes? Quando os atirava ao ar, diziam-me, tens de pensar em tudo menos na necessidade de eles caírem direitos na frigideira. Se te concentras no voo, podes ter a certeza de que caem enrolados, ou se esborracham em cima do fogão. É ridículo, mas é justamente a distração que conduz ao centro das coisas, ao coração.
Agora, quem tem a palavra não é o meu coração, é o meu estômago. Resmunga e tem razão, porque, entre um crepe e uma viagem ao longo do rio, chegou a hora de jantar. Tenho de te deixar, meu querido Blog. Mas antes de te deixar, deixo-te toda a ternura do mundo.

quinta-feira, novembro 10, 2005

LIBERDADE

Além de idéias e conceitos limitadores, outras bananas comuns são os empregos. Muitas pessoas são infelizes no que fazem, mas se mantêm no mesmo emprego com medo de fracassar. Fala a experiência. O pior é que essas pessoas não se dão conta de que já são fracassadas.
Será que vale a pena nos agarrarmos a algo que nos tira a felicidade e a liberdade de sermos nós mesmos? Pessoas que se apegam pelo medo da mudança morrem lentamente, perdem suas vidas, por não terem coragem de arriscar o novo.
São pessoas com a síndrome do sapo. Dizem que se colocar-mos um sapo numa panela sem tampa com água e levá-la ao fogo baixo, ele vai cozinhando aos poucos e nem percebe que está morrendo. Fica parado e não e não tem a iniciativa de pular da panela ou mudar a sítuação!
A paz só é possível quando aprendemos a abrir mão daquilo que já não nos faz bem algum, daquilo que rouba nossa energia e a nossa harmonia. Às vezes, temos que aceitar que alguém não faz mais parte da nossa vida ou que está na hora de mudar de emprego, mesmo quando não temos experiência numa outra área. E sempre temos que rever as idéias, os conceitos e os pensamentos que nos mantêm presos nas melancias da vida.
Quantas vezes nos apegamos a uma relação que já não nos traz nada de bom porque temos medo de não encontrar uma pessoa mais adequada com os nossos sonhos e com a nossa vida...Esses e todos os outros tipo de apego que possamos praticar ao longo de nossas vidas são falsos apoios.
Na verdade, o que realmente possuímos e à qual podemos nos apegar é a nossa fé, nossa vida e, especialmente, a maneira que usufruímos dela...
Quanto mais presos e apegados ficamos, mais difícil será viver em paz. Quanto mais leves e soltos, maiores serão as nossas chances de sermos felizes.

E é bom saber e sempre lembrar que o que levamos da vida, é a vida que levamos.

terça-feira, novembro 08, 2005

LAGO




Quando encontramos a paz nas pequenas coisas da vida, e ao lado de alguém que nos sentimos a par espiritualmente, os nossos problemas minorizam, e aí, então passamos a encarar a vida como uma oportunidade para o nosso próprio crescimento. Quando a superfície de um lago está bem tranquila, podemos enxergar nitidamente o que existe lá no fundo. Mas basta uma leve rajada de vento para que se formem pequenas ondas, dificultando um pouco a visão.
Se jogarmos uma pedrinha na água, as ondas se tornam mais agitadas, quase escondendo o que existe no fundo. E se agitarmos a água com uma vara, não conseguiremos mais enxergar o fundo do lago.
Assim é a nossa mente; um lago que guarda muitos tesouros debaixo das suas águas. Tesouros que a maioria das pessoas nem sequer suspeita que existam.
Mas eles estão ali, e podem ser percebidos por aqueles que conseguem serenar as águas do lago mental. E quando as águas ficam tranquilas, a gente começa a descobrir os tesouros e usufruir de todas as coisas boas que eles podem nos proporcionar.
Vivemos num mundo carregado de pressões e conflitos. Por isto, a todo momento nosso lago - mental é agitado pelos pensamentos de inveja, de ciúmes, egoismo, descrença, medo, ódio, vingança e outras vibrações altamente negativas. Essas vibrações provocam ondas que não nos permitem enxergar os tesouros no fundo do lago. Mas nós podemos neutralizar as vibrações negativas, equilibrando nossa mente com vibrações de paciência, tolerância, compreensão, perdão e amor. E este equilíbrio se dá através do amor que cada um trás dentro de si. Apaixone-se pela vida, pelas pessoas, e vivam com intensidade ao lado de alguém que amam. E sintam o silêncio desse amor. Ele é o nosso lago.

quinta-feira, novembro 03, 2005

CORAÇÂO

Cada dia mais, estou certa de que Deus se manifesta através do coração de cada um, ou seja, que cabe a cada um conhecer o seu próprio coração para que possa haver, de fato e independentemente de qualquer religião, uma espirítualidade concreta em sua vida.
A evolução espíritual não consiste em procurar respostas nos templos, nas Igrejas ou nas pessoas que nos parecem mais esclarecidos e sensíveis. Todos estes podem ser caminhos para que cheguemos mais rapidamente às verdadeiras respostas, mas elas estão - e sempre estarão - dentro de cada um de nós.
Enquanto insistirmos em buscá-las em qualquer outro lugar que não seja, antes,em nós mesmos, nada realmente válido ou autêntico encontraremos.
O espírito de cada um é onde está depositada a inteligência Divina, do qual somos dotados desde que fomos criados. É através do exercício desta inteligência que agimos com humanidade e justiça. Quando permitimos que nosso espírito, aliado a esta divindade, se manifeste, podemos nos tornar mais capazes de perdoar e de nos doar ao mundo.
Quando não conseguimos perdoar alguém, é porque não estamos conseguindo exercer a nossa espíritualidade inteligente. Creio nas energias que nos empurram para as situações positivas e energias negativas para situações negativas. Não perdoar é acumular energias negativas, é escurecer o caminho, é distanciar-se das respostas e de si mesmo. Quando julgamos as atítudes de outras pessoas , é porque não estamos conseguindo exercer a nossa espíritualidade inteligente. Não nos cabe julgar as atitudes alheias, mesmo porque o coração de cada um é como um tesouro. Somente Deus e cada um ( se fizer um trabalho interior e profundo, interessado e com amor) pode conhcê-lo.
Atitudes são visíveis e passíveis de julgamentos errados. Mas o essencial é invisível aos olhos. O que realmente importa requer sensibilidade, inteligência e amor para ser julgado. E, definitivamente, este julgamento não cabe a nenhum de nós seres imperfeitos. Quando falamos demais das coisas que não nos dizem respeito, sabendo que nenhuma de nossas palavras tem poder benéfico sobre taís situações ou pessoas, é porque não estamos conseguindo exercer a nossa espíritualidade inteligente. Precisamos aprender a respeitar a individualidade do outro e o espaço alheio, inclusive o tempo que cada um precisa para mudar, evoluir e melhorar.
Precisamos usar de menos prepotência e mais, muito mais humildade. A evolução espíritual está baseada, ao meu ver, principalmente nestes pontos fundamentais e urgentes:

Queres ser amado?Procura amar. Queres ser compreendido? Esforça-te para compreender. Desejas ser respeitado? Respeita os outros; queres misericórdia? Perdoa sempre.

Amar e aceitar os outros, apesar de serem imperfeitos; aceitar e amar a vida, muito embora não seja plenamente feliz; aceitar e amar a si mesmo, apesar de todas as fragilidades.