sexta-feira, junho 30, 2006

RIBAMAR


De partida para mais uma semana de trabalho entrei no carro, ainda noite depois de deixar para trás tudo o que me dava felicidade e paz.
Ansiosa, agitada e algo nervosa pois o caminho era longo e também como única companhia tinha uma estação de rádio que ia desejando um bom acordar e tentando incutir aos seus ouvintes a boa disposição, necessária a encarar uma longa semana.
Enquanto a viagem decorria sentia o desejo cada vez maior de inverter o sentido de marcha e voltar para casa.
Mas não podia fraquejar, tinha de seguir em frente, pois estava um grupo de meninos do SASE com demasiadas expectativas à minha espera.
Quando ouvia uma música conhecida, os meus olhos enchiam-se de lágrimas, pelas recordações que me assaltavam o pensamento e, sei que em alguns momentos falava comigo própria.
Podia ser loucura, mas fazia-me bem. Claro que esta situação teve também o seu lado positivo, pois foi bom perder certos medos, de andar tão longe só.
Rezava literalmente, para não ter nem um furo ou outra avaria qualquer com receio de entrar em pânico e não saber o que fazer.
Alguém me ouviu, pois nunca tive qualquer problema.
Hoje lembro esses momentos com exactidão, mas com poucas saudades, pois corri muitos riscos a vários níveis.
Como a primeira viagem, não há mais nenhuma, mas sentir na pele o quanto custa abandonar a família principalmente os filhos, o medo de acontecer algo imprevisto, isto repetia-se todas as semanas de segunda a segunda...
Volvidos alguns anos, não é difícil caracterizar um misto de emoções e experiências vividas sempre no seu máximo e, claro aprender com o que de melhor tiver existido, no entanto, mesmo das situações mais negativas se podem tirar benefícios.

quarta-feira, junho 28, 2006

CHUVA

Já paraste para ouvir a chuva cair.
Em gotejo gordo e redondo.
Dizendo"estou aqui, estou aqui"...

Em experiência meditativa.
Ergo-me por detrás da vidraça.
E olho e vejo e sinto.
mais que isso: ouço.













O som macio afaga-me os sentimentos.
De fora para dentro lava-me.
E leva-me as agitações necessárias.

Semicerro o olhar.
E já não somos dois: a chuva e eu.
Ingresso no ser líquido.
Deixando-me ser.
Água e rio e corrente e mar...

Já experimentaste erguer-te ante a vidraça.
Para sentires o falar da chuva?

quarta-feira, junho 21, 2006

FALHAS

Mesmo sabendo que envelheço.
A cada dia, cada ano que passa.
Não esmereço, nem esqueço o tempo que desliza.
Tudo tem um tempo ...Tudo passa.
Renasci...Para o sonho vivido.
Que se fez verdade, num tempo adormecido.
Despertei num amanhã incerto.
Nos braços que não me deste.
Prefiro o relógio da vida.
Que me comanda e, marca a verdade.
Somos em forma tão diferentes.
Por isso liberto-te das correntes.
Que as tuas palavras são a arma.
Dos teus pensamentos, sem balas.
mesmo quando pensas saber.
de tudo aquilo que magoas, que falas.

Debruço-me sobre o tempo.
Acaricio tuas vontades.
Que me despem de dor e não me dão prazer.
Não quero sentir sombras.
Do nosso amor, que me fez não ser...
Celebrarei sempre, os dias do amor.
Os que foram só nossos.
De que mesmo ainda amando.
Amarte-ei sem remorsos.

terça-feira, junho 20, 2006

José carlos

O inverno passou lento, pesado, frio, cortante e destruidor. Alguns idosos cuja fraca seiva vital se esgotou no maior consumo de energias enlutaram algumas famílias do bairro Lopes.
A primavera desejada voltou, trazendo consigo o calor do sol e os ventos cortantes de frio deram lugar às brisas das manhãs calmas.
Nas encostas batidas pelos raios solares e abrigadas da brisa mais fresca do mar nas noites ainda longas, as primeiras flores silvestres animaram a paisagem salpicada de pétalas branca e rosa.









Nas tardes mornas, a sombra dos salgueiros junto ao ribeiro que cantava de águas cristalinas, era o nosso ponte de encontro marcado, fora do bairro, libertos dos olhares indiscretos e recriminatórios das velhas, repositório da moral e dos bons costumes tradicionais. O nosso amor, a nossa meninice e a nossa pureza magoava as suas consciências cristalizadas de uma infância, distante, perdida e talvez mal vivida.
Saltitávamos de mão dada, pés descalços pela corrente fresca, segurando na outra mão os chinelos descalços que tinham que voltar secos.
Assustávamos os cardumes de pequenas enguias e os pássaros que, como nós, pipilavam na música da primavera renovadora da natureza no seu eterno movimento.
Guardo na memória José Carlos, e a frescura dessas tardes, a beleza da sua fresca meninice, o sabor dos seus beijos na face perfumados, a sinceridade ingénua das nossas promessas de amor e a sua lembrança serve-me de suave alento nos dias frios de inverno que se vai instalando no aproximar do outono da vida.

segunda-feira, junho 19, 2006

Sonho de criança

Sentada na fria soleira e abrigada do vento pela grossa cantaria oval da porta da igreja, eu esperei por ti... Mãe. Soprava das mãos o frio que tolhia os dedos, e batia no chão molhado os chinelos que não eram sufícientemente grossos para proteger os pés da humidade gelada daquela noite de Natal.
Prometeras vir e eu nem sequer me interrogava da verdade dessa presença que seria o presente mais importante que o Pai-Natal, em que eu já não acreditava, me poderia oferecer.















Como qualquer criança que coloca o sapatinho na chaminé e fica na cama, fingindo dormir, mas à escuta do mais leve ruído na cozinha, eu escutava quaisquer rangidos que me anunciassem os teus passos.

As badaladas do sino a cada quarto de hora, a cada hora, mantinham a minha cabeça desperta do sono e aumentavam a ansiedade e a angústia do tempo que passavam sem que deslumbrasse a tua imagem ao virar da esquina.
Segurava entre as mãos regeladas um frasquinho de lavanda, que comprei com as moedas tiradas do mealheiro com a ponta da faca, para que o meu pai não percebesse que gastava o dinheiro que pedia pelos santos populares, especialmente no dia de Santo Antonio.
Gostaria de ter um ramo de flores para te oferecer mas em Dezembro não havia flores, e assim, aquela água de colonia seria a minha primeira prenda, que irias guardar com tanta ansiedade como a que eu sentia quando a comprei sem conseguir evitar um sorriso trocista da Senhora da drogaria.
O sino bateu as doze badaladas e tu não apareceste. Em cada casa soavam as vozes alegres da ceia e os cântigos de graças pelo Menino que acabara de nascer.
Eu guardei o frasco na algibeira do bibe crispando as mãos e rangendo os dentes de frio, de dor e desilusão.
Na esquina da rua chocámos no nevoeiro, tu corrias ao meu encontro enquanto todos ceavam.
Aquela visão foi a minha melhor prenda de Natal.

sexta-feira, junho 16, 2006

Ainda perplexa

A vida é uma estrada sinuosa que tem de ser percorrida com firmesa e esperança.

Foi com estas palavras que terminei um dos meus textos anteriores neste dia que não me apetecia escrever. Há momentos assim. Momentos em que parece haver qualquer coisa que nos avisa. Há quem lhe chame pressentimento. Não sei. Talvez a experiência nos avise de que, em todos os momentos da vida, nunca há certezas e quanto mais confiantes maior será a surpresa e a desilusão.

Muitos como eu estão neste momento sentindo o mesmo desalento, a mesma frustração, a mesma impotência perante o girar dos acontecimentos. Muitos como eu acreditaram que os homens inteligentes agiam com honestidade e de acordo com o valor da vida e das pessoas. Porém, por muito avidados que estejamos, há momentos em que esquecemos que todos os homens são falíveis e as suas acções obedecem a razões que desconhecemos.

Quanto maior é o amor mais se sente a traição. Quanto maior é a confiança maior é a desilusão.
Mudam-se os tempos , mudam-se as vontades. È bom que ao menos esqueçamos, e que amanhã saibamos de que lado devemos estar, e que as difículdades sirvam para unir aqueles que lutam pela mesma causa.

A vida é uma estrada sinuosa.

Hoje não consigo escrever

Não consigo mesmo. Há demasiadas coisas na minha cabeça. E quando há demasiadas ideias baralham-se, não se arrumam. Nunca mais acaba o futebol, estou farta. Entretanto o País continua suspenso duma crise política que não pedimos nem somos culpados mas em que aturamos os mais diversos disparates, desde um que fala como se já fosse primeiro ministro e não houvesse acima dela a quem deve respeito, a outro ( um alarve ), mas que faz parte do mesmo partido, que nos agride os tímpanos com asneiras de fazer corar qualquer besta.
Apetecia-me falar de amor, de amizade, de carinho, de sentimentos de que o país anda tão parvo, mas as mãos crispam-se, os nervos retesam-se as palavras faltam.
Àqueles que habitualmente me lêem e àqueles que por acaso aqui passam, um abraço fraterno. É bom sabermos que, ao nosso lado, do outro lado, no fio do limite espacial, há sempre alguém que lê as nossas palavras, que entende a nossa mensagem, que pensa e sente como nós.
A vida é uma estrada sinuosa que tem de ser percorrida com firmeza e esperança

quarta-feira, junho 14, 2006

Saudade da minha Infância

É certo que se não tivéssemos vivido não seríamos hoje aquilo que somos. não seríamos nada. Ser alguma coisa, boa ou má, rica ou pobre, simples ou complexa, sábia ou ignorante, implica ter vivido.
Cada momento que vivemos deixou a sua marca, o seu traço, o seu caracter na escrita de cada página deste livro que é a nossa vida.
O passado, embora haja quem diga que não existe, o meu passado sou eu. Não vale a pena arrependermo-nos nem sequer voltar a trás. Não há movimento para trás. Não há retorno nem retrocesso, nem sequer podemos reduzir a velocidade, para descansar, fazer uma pausa.
Resta-nos esta maravilhosa faculdade da memória. É uma riqueza incalculável de que dispomos podermos evocar, na nossa mente, momentos distantes no tempo mas presentes em nós.
Como é bom poder estar hoje a ouvir música enquanto escrevo estas linhas e nelas vou registando, partilhando com quem vier a lê-las as lembranças da minha infância. A quinta com os seus vales e outeiros, as cores, a multiplicidade de cores que o campo nos oferece, os animais que fazem parte da família, a frescura do ribeiro, a música da corrente, o chilrear dos pássaros, a luz de cada manhã de primavera, o silêncio das noites do campo apenas quebrado pelo estridular dos grilos. os cheiros, os aromas da natureza, da terra, das plantas, das flores e dos frutos. O cheiro da noite, da terra húmida, do orvalho da manhã.
Lembro os livros que li. Não os livros nem os seus autores, nunca decoro o nome dos autores, o que eu lembro é o prazer que dava ler, às escondidas do meu pai, os livros que um amigo mais velho me emprestava. Aquela leitura escondida fazia de mim um ser importante, lia as coisas que os outros não liam, corria a minha mente por tempos e espaços que eram só meus, falava com aquelas personagens como se fossem minhas amigas elas faziam parte do meu mundo.
Com que saudade eu me lembro da Hirondina! Aquela manhã em que juntas almoçávamos pão com banha de porco junto ao pequeno ribeiro da quinta, à sombra das figueiras por onde a luz da manhã passava em reflexos de arco-íris. A Hirondina era mais velha que eu. As figueiras rodavam por cima de nós e eu sentia-me louca pendurada nos seus ramos, era uma sensação maravilhosa, até explodir e ficarmos ambas a arfar de cansaço e de alegria.
Como tenho saudade, desse tempo, da minha infância

sexta-feira, junho 02, 2006

QUANDO SE AMA

Basta-me abrir os olhos! Qualquer objecto que estiver ao meu redor, qualquer ser vivo ou inanimado que a natureza coloca ao nosso alcanse, qualquer sombra, astro, estrela, satélite, qualquer grão de areia, qualquer ser humano, permitirá que eu te veja, já que eu te encontro em tudo que meus olhos alcançam.
Basta-me aguçar os ouvidos! Qualquer som, qualquer música, qualquer melodia, qualquer palavra, o silvo do vento, a sinfonia dos pássaros, o balançar das árvores e flores, o som da chuva, ou das águas do mar, dos rios, das cascatas, ou das brincadeiras infantis, dos veículos no trânsito, da campainha de um telefone, do motor de um avião, do choro de uma criança ou, até mesmo, o som do silêncio, permitirá que eu te ouça, já que a tua voz está dentro dos meus ouvidos.
Basta-me fechar os olhos! Tornar-me surda, muda, ausentar-me do meu corpo, esquecer-me de mim. E sentirei minha alma abraçando a tua, os nossos anjos encontrando-se, o meu coração batendo à porta do teu, os meus pensamentos querendo adivinhar os teus, os meus sentimentos totalmente entregues ati.
Basta-me orar! E estarei rogando por ti, por tua saúde, por tua paz, por tua alegria, pela tua felicidade.
Não seria, então, muito melhor que essa luta incansável tenha um fím e que tu nos permitas viver com felicidade e harmonia, essa dávida que a vida nos deu? Jamais haverá grandes ou pequenas distâncias entre nós, ainda que elas possam existir fisicamente, porque o amor não sabe o que é isso, não aprova, não compactua, não reconhece, não deixa espaço entre almas que se pertencem. E a minha sempre te pertenceu!