Enquanto olho para um monte de fotografias que estão dentro duma caixa que eu guardo religiosamente eu penso: quantas daquelas pessoas já tinham falecido, tinham tido algumas experiências afectivas comigo. Pouquíssimas. Talvez uma ou duas. Mesmo assim, a maioria continuava na caixa como um ritual de lealdade. Lealdade é um dos sentimentos mais nobres do mundo.Enquanto escrevo penso nelas todas. Uma vez por outra, vou para a frente do computador, olho para o mar desconhecido da minha alma, vejo que dentro de mim existem duas ilhas - ideias que se desenvolveram e estão prontas para ser exploradas. Então, agarro no meu barco - chamado Palavra - e resolvo navegar para aquela que está mais próxima. No caminho, defronto-me com correntes, ventos tempestades, mas continuo a remar, exausta, agora já consciente que fui afastada da minha rota: a ilha que eu queria chegar deixou de estar no meu horizonte.
Mesmo assim, não posso voltar atrás; tenho de continuar de qualquer maneira ou ficarei perdida no meio do oceano - neste momento, passa-me pela cabeça uma série de cenas aterrorizantes, como passar o resto da minha vida a ver as fotografias já meio debotadas pelo tempo, e criticar-me amargamente se as rasgar.
Movida por estes pensamentos para mim assustadores, descubro uma força e uma coragem que desconhecia existir: elas ajudam-me a aventurar-me e rasgar algumas delas e entrar pelo lado desconhecido da minha alma, deixo-me levar pela corrente e acabo por ancorar o meu barco na ilha para onde fui conduzida. Passo tempos infinitos a descrever o que vejo, perguntando-me porque estou agir assim, dizendo a cada instante que não vale a pena a minha lealdade, que não tenho que provar nada a ninguém, que tinha de conseguir tirar aquelas fotos da minha vida, ter paz. aquela que eu sonhava, poder dormir.
A partir daí, deixo de ser a mulher perdida na tempestade: encontro-me comigo mesma. Em raros momentos, como este que está prestes a acontecer daqui a pouco, consigo olhar algumas das fotos, e olhar as pessoas nos olhos, e compreender que já não fazem parte da minha vida, e tentar perceber que também a minha alma não está só.
Tenho coragem.
Não, tenho medo. mas não tenho escolha

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